quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Comemorar?

Comemorar?

Marilena Chaui, no capitulo “comemorar?” do livro “Brasil: mito fundador e sociedade autoritária” indaga a respeito das relações de poder na sociedade brasileira e em que momento histórico essas relações tiveram origem em nosso país.
          
A sociedade brasileira conserva as marcas da sociedade colonial, ou seja, a cultura senhorial, que é marcada pela estrutura hierárquica do espaço social. Os aspectos dessa cultura são: os superiores, ou abastados, mandam e os inferiores, ou desprovidos de poder, obedecem.  Quando há relações entre os que se julgam social e economicamente iguais essas relações são de “parentesco”. Já os que são vistos como desiguais essas relações são vistas como “favor”, “clientela”, “tutela” ou “cooptação”. Em sentido restrito, quando a desigualdade é muito acentuada, a relação social assume a forma de opressão física ou psíquica.
          
Tendemos a imaginar que o autoritarismo é um fenômeno que afeta o Estado negativamente, e por isso não enxergamos esse autoritarismo em nossa sociedade, mas a verdade é que ele existe e somos nós que não percebemos as suas deferentes manifestações, e são delas que advém o autoritarismo político.
          
As características de uma sociedade autoritária com princípios senhoriais são: O principio da igualdade formal dos indivíduos perante a lei no Brasil, mas no liberalismo econômico a que estamos submetidos vigora a idéia de que alguns são mais iguais do que outros. As divisões sociais são vistas como inferioridade natural, é o caso de mulheres, trabalhadores, negros, índios, emigrantes, migrantes, e idosos. Essas diferenças às vezes podem ser vistas como desvios da norma como é o caso das étnicas e de gênero.   E há diferenças que podem ser vistas como perversão ou monstruosidade pela sociedade como o homossexualismo.
         
Também podemos constatar a sua estruturação como sociedade a partir das relações privadas, fundadas no mandar e no obedecer. Por isso existe uma dificuldade imensa em assegurar os direitos civis. Quando ocorre uma manifestação popular logo ela é reprimida. Logo fica evidente que as leis são abstratas e aparecem com inócuas, inúteis e incompreensíveis, feitas para serem transgredidas e não cumpridas. Pois “o poder emana do povo e é para o povo” (Const. Brasileira), mas não é isso que vemos em nossa democracia.
          
Chaui discute semelhantemente a questão do público e do privado. A origem da propriedade privada se deu no Brasil com a distribuição de grandes faixas de terras a particulares, embora sob o comando do monarca e da metrópole. Os donos dessas terras dirigiam senhorialmente os seus domínios e dividiam a autoridade com o estamento burocrático. Disso, surgiram futuramente os governantes e parlamentares, pois estes só poderiam se candidatar a um cargo se possuísse certa quantia de terra e de bens. E as relações exercidas entre os governantes e a camada pobre da população eram uma relação de favor, clientela e tutela. São por esses motivos que os governantes e parlamentares “reinam” e são os donos do poder. “Do ponto de vista dos direitos, há um encolhimento do espaço público; do ponto de vista dos interesses econômicos, um alargamento do espaço público”(p.91).
          
A nossa formação social visa desenvolver ações e imagens com força suficiente para bloquear os trabalhos e conflitos sociais, econômicos e políticos, esses distúrbios negam a imagem de uma boa sociedade indivisa, pacifica e ordeira. Logo o Estado ver tais atos como sinônimos de perigo, crise e desordem. E baseado nesta visão o Estado disponibiliza a repressão policial e militar para as camadas populares.
          
A sociedade sonhorial preza a fidalguia e o privilégio e utiliza o consumo de luxo como forma de demarcação da distancia social; a manutenção da criadagem doméstica  cujo numero indica aumento de prestigio e “status”; e a grande valorização dos diplomas que credenciam atividades não manuais e no conseqüente desprezo do trabalho manual, como se vê no enorme desprezo com o salário mínimo.
          
A existência dos sem-terra, dos sem-teto, dos milhões de desempregados é atribuída à ignorância, e à preguiça dos miseráveis. A existência de crianças sem infância é vista como tendência natural dos pobres à vadiagem, à mendicância e a criminalidade.
          
O Brasil ocupa o segundo lugar mundial nos índices de concentração de renda e de má distribuição de riqueza, mas ocupa o oitavo lugar mundial do PIB. Dois por cento da população brasileira possuem 98% da riqueza nascional enquanto 98% possuem 2% dessa renda. E isso não é visto como uma forma de “apartheid” social, mas como algo normal. “Os partidos políticos são associações de famílias rivais, ou seja, verdadeiros “clubs privés” das oligarquias regionais.”(p.93)
          
Em uma sociedade senhorial, os poderes Executivo, legislativo e Judiciário são reduzidos a sentimentos de que o primeiro é corrupto e o segundo é injusto e há um certo medo despertado pelo terceiro. Isso é reforçado pelo fato de a classe dirigente ver a sociedade como inimiga e perigosa, e procura bloquear as iniciativas dos movimentos sociais, sindicais e populares.
          
O liberalismo econômico no Brasil levar-nos-ia a dois extremos: a carência absurda e o privilégio exagerado. 

Logo, Marilena Chaui, chega a conclusão de que a inclusão econômica e política de toda a população é utópica numa sociedade capitalista como a nossa. Então ela termina o seu texto dizendo que “como se vê, não há o que comemorar”(p.95) - o que explica o por quê do título no inicio do capitulo que acabamos de resumir.

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¹ Graduando em Letras Vernáculas pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB) – Jequié. É professor, poeta e palestrante em cultos protestantes.

Um comentário:

Lucas disse...

Toda sociedade possui hierarquia isso se tornou uma consequência de se viver em sociedade. Bom texto Emerson, mas considero que há o que comemorar sim, pois nosso pais está diminuindo esse abismo entre classes, a passos de tartaruga bem verdade, mas estamos evoluindo para uma sociedade mais justa. Cabe a cada um de nós, integrantes da sociedade cobrarmos mudanças dela já.